Era
uma vez uma agulha-tricô.
Posta
à janela após morte de avó,
lá
quis ficar a fazer companhia
ao
cego triste surdo insone avô,
pois
assim ambos não seriam só
contos
antigos da Má Carochinha.
Mesmo
que nada escutasse o bom velho,
não
lhe faltava na casa a viola
que
junto à velha prestou sua vigília.
Mas
eis que num fim de tarde vermelho
o
enrugado viúvo a vitrola
deixou
tocar uma antiga modinha.
Então
agulha-tricô sentiu vida:
ouviu
agulha-vitrola soar
e
retiniu toda em Si-alegria.
Em
meio às notas lhe veio a dúvida.
— Como podia metal bem cantar?
Logo
esqueceu malha, lã, fibra e linha;
pel'outra
agulha se frivolitou
e
fez rotina a canção de sua amiga
toda
hora sétima do pôr-do-dia.
Até
que a Morte o velhinho abraçou
e
seus seis filhos se puseram em briga
por
cada bem que o defunto detinha.
Foi
assim que vitrola emudeceu;
levou
consigo agulha tagarela,
ao
que a dos fios macramou-se agonia.
Por
pouco tempo, no entanto, sofreu.
Pois
viu, manhosa, de sua janela,
haver
vitrola na casa vizinha.
Mergulhão
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Frivolitê: técnica de
tecer nó e picô cuja sequência forme renda.
Macramê: técnica de tecer
fio sem ferramenta.
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– – – – – – – – – – – – – – – – – – o que viu nessa estrada?